Nesta semana minha esposa surgiu com um pedido nada comum: “me faça uma carta para daqui 25 anos!”. O pedido inusitado faz parte de um projeto do Colégio São José onde ela estudou e trabalha. Quando adolescente não estava na turma que enviaria os recados para o futuro, mas agora como professora, seu envelope estará entre os de alunos e colegas que retornarão em um quarto de século para ver o seu conteúdo.
Quando a proposta surgiu, a princípio fiquei empolgado, mas depois também apreensivo. Afinal, eu não escreveria uma carta para a minha esposa, mas para alguém que ela se tornará ao longo do tempo. Pensei no movimento contrário, quem eu era há 25 anos? Pois bem, uma criança de 11 anos tem muito pouco a dizer a seu futuro, não é? Com essa idade, será que eu sonhava em ser quem eu sou? Será que eu realmente pensava no futuro que hoje é presente?
Quando somos crianças temos a bênção de não entendermos o preço do amanhã. O tempo corre em uma velocidade diferente, alguns dias eram quase infinitos, podia se fazer tudo e ainda sobrava tempo. Quando foi que o nosso tempo ficou tão curto? Tão escasso? Quem roubou o nosso tempo?
Saiba caro leitor e leitora que a resposta não é fácil de se dar, afinal, o culpado é também a vítima. Na ânsia de conseguir tantas coisas que eu nem sonhava com 11 anos, o Guilherme Bomba de 36 anos tem muito menos tempo de apreciar a passagem do dia que se mostra cada vez menor. “Ah, o dia deveria ter 36 horas para fazer tudo”, eles dizem, mas será que o correto não seja ter menos coisas para fazer, já que o dia sempre será o mesmo, perceba você ou não?
Em 25 anos minha amada esposa terá 62 anos, minha filha mais velha terá 34 (quase a mesma idade que temos hoje), meu filho terá 30 e a pequena, 28. E se vierem, quem serão os cônjuges? Quem sabe eu já seja avô! Meus cachorros já não estarão aqui, afinal, já estão hoje na chamada velhice canina, então prefiro não pensar.
E a partir daí, doeu pensar que muitos que amo podem também não estar por aqui. Parece trágico pensar em um futuro que parece tão distante, mas ao mesmo tempo, tão perto... Nenhum tempo seria suficiente para fazer tudo o que desejamos, mas também as pessoas não viverão tempo suficiente para esperar que o façamos. Logo, entre tentar fazer tudo e não ter tempo, seria melhor escolher menos coisas e mais as pessoas.
Escrevi a carta para ela, mas no fundo escrevia uma carta para mim mesmo, esperando que tudo o que senti ao escrever possa se tornar realidade. Pela perenidade da vida e sua inevitável oposição, de alguma forma garanti que estarei vivo em 25 anos, seja como for.
Ao meu eu de 11 anos, se pudesse, não diria nada com medo de tentar consertar todos os meus erros que me trouxeram até aqui. Ao meu eu de 61 anos, deixo registrado que até aqui temos sido o mais feliz possível em nossas limitações e imperfeições. A busca pela felicidade tem se tornado cada vez mais focada em ser do que em ter, não por um olhar pessimista ou conformista, mas por entender que dinheiro nenhum poderá comprar esse momento, aqui e agora. Então por que não vive-lo? Não sou o mesmo de 11 anos e não conheço o senhor de 61 que me tornarei, por enquanto me contento com esse velho conhecido de hoje, que escreve cartas demais para alguém de sua idade.