DIREITO & JUSTIÇA

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Abandono afetivo: quando a omissão gera reparação civil

Da Redação

| Edição de 11 de julho de 2025 | Atualizado em 11 de julho de 2025

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O afeto não pode ser imposto por lei, essa é uma máxima repetida nos tribunais e fora deles. No entanto, o dever de cuidado, de presença e de amparo moral e emocional de um pai ou de uma mãe com relação ao filho é mais do que uma questão de sentimentos: é uma obrigação jurídica. Quando essa obrigação é descumprida de forma grave, surge a possibilidade de reparação por abandono afetivo.

Essa foi a conclusão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reafirmou esse entendimento ao condenar um pai a pagar R$ 30 mil a título de danos morais à filha, por ter se omitido completamente do exercício da paternidade. A decisão destacou que o homem jamais demonstrou qualquer interesse pela filha, não tendo estabelecido qualquer vínculo afetivo ou prestado qualquer apoio, mesmo tendo plena ciência da existência da criança desde o seu nascimento.

Segundo os autos, após a separação do casal, o pai abdicou de participar da educação, criação e do desenvolvimento da filha. Em virtude disso, a criança necessitou de tratamento psicológico.

Na primeira instância foi fixada indenização no valor de R$3mil e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou essa decisão para julgar improcedente o pedido da filha, sob o argumento de ser impossível quantificar a dor decorrente da falta de amor ou cuidado no âmbito da relação parental.

Em recurso dirigido ao STJ, esse entendimento foi reformado e o valor da indenização foi majorado para R$30mil.

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou que se a parentalidade é exercida de maneira irresponsável, negligente ou nociva aos interesses dos filhos, e se dessas ações ou omissões decorrem traumas ou prejuízos comprovados, não há impedimento para que os pais sejam condenados a reparar os danos experimentados pelos filhos, uma vez que esses abalos morais podem ser quantificados como qualquer outra espécie de reparação moral indenizável. 

A ministra pontuou, ainda, que “O recorrido ignorou uma conhecida máxima: existem as figuras do ex-marido e do ex-convivente, mas não existem as figuras do ex-pai e do ex-filho”.

No caso concreto, o STJ destacou que a indenização não se confunde com uma tentativa de forçar amor ou afetividade, mas representa o reconhecimento jurídico da violação aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, previstos no artigo 227 da Constituição Federal e reforçados pelo Código Civil. Houve, inclusive, prova pericial conclusiva nos autos, demonstrando que a ausência paterna gerou sofrimento psíquico relevante à filha, o que evidenciou o dano moral e fundamentou a reparação civil pelo abandono afetivo.

Essa decisão tem caráter pedagógico e simbólico: ela não banaliza o instituto da responsabilidade civil, tampouco transforma desentendimentos familiares em demandas judiciais, mas envia uma mensagem clara de que negligenciar a parentalidade não é indiferente, mas lesivo.

A reparação civil por abandono afetivo permanece sendo uma exceção, aplicada com parcimônia e análise rigorosa do contexto. No entanto, casos como este provam que, quando há ausência completa e injustificada de afeto, cuidado e presença, a omissão também pode — e deve — ser responsabilizada.

Em caso de dúvidas sobre abandono afetivo ou direitos relacionados à convivência familiar, procure a orientação de uma advogada (o) de confiança. Informação é proteção.