Apesar do presidente Michel Temer (MDB) ter anunciado um acordo com representantes dos caminhoneiros, a greve da categoria se manteve ontem em todo país. De acordo com os manifestantes, a associação à qual eles são vinculados não participou da mesa de negociação. Na região, até o início da noite de ontem, os caminhoneiros continuavam mantendo bloqueios em 6 pontos mesmo após o governo federal ter endurecido o discurso e anunciado uso das forças armadas para restabelecer a ordem nas rodovias.

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Na noite de anteontem, o governo chegou a anunciar um acordo com representantes dos caminhoneiros e a paralisação da greve por 15 dias. Em troca, a Petrobras manteria a redução de 10% no valor do diesel nas refinarias por 30 dias enquanto o governo costura formas de reduzir os preços. O acordo, entretanto, vale apenas para o diesel, sem incluir reduções no preço do etanol, da gasolina ou de impostos de modo geral.
O governo também se comprometeu a zerar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para o diesel até o fim do ano e negociará com os estados buscando o fim da cobrança de pedágio para caminhões que trafegam vazios, com eixo suspenso.
Um dos coordenadores dos protestos da região, André Gustavo Pereira, é caminhoneiro há 10 anos. Segundo ele, a decisão não vale nada. “O governo quer, com isso, manipular a opinião pública, que atualmente está do nosso lado. As entidades que aceitaram esse acordo não nos representam. Vamos continuar com os protestos a todo vapor”, diz.
Das 11 entidades que participaram do encontro, duas delas rejeitaram a proposta. Uma é a Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), que representa 700 mil trabalhadores em todo o país e à qual os manifestantes da região são vinculados.
Ontem, após reunião no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que contou com a participação de ministros e do presidente, Temer anunciou em pronunciamento oficial a autorização do uso de forças federais de segurança para liberar as rodovias bloqueadas. Ele ainda pediu o apoio das forças de segurança de cada estado. Ainda ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminar autorizando o uso das forças de segurança e impondo multa de R$ 100 mil por hora em caso de descumprimento.
Após o anúncio, a Abcam, em seu site, divulgou um comunicado oficial pedindo que os manifestantes não interditem as rodovias, mas mantenham os protestos de forma pacífica, sem obstrução completa do tráfego. Na região, até o início da noite de ontem, entretanto, os caminhoneiros continuaram impedindo a passagem de caminhões carregados em pontos de duas rodovias estaduais a PR-444, em Arapongas, e PR-466, em Jardim Alegre, e duas rodovias federais: a BR-376, em Califórnia, Ortigueira e Mauá da Serra, e BR-369, em Arapongas.
No início da noite de ontem,o o Ministério da Segurança Pública, divulgou um balanço que 419 de um total de 938 pontos interditados em rodovias de todo o país (quase 45%) tinham sido liberados.
A Tribuna entrou em contato com o 30º Batalhão de Infantaria Mecanizado (BIMec) de Apucarana, que afirmou durante a tarde desconhecia qualquer ordem para atuar nas manifestações.
Manifestantes criticam forma como governo tratou assunto
De acordo com dados das polícias rodoviárias Federal (PRF) e Estadual (PRE), divulgados no início da noite de ontem, são ao todo 243 pontos de bloqueio nas estradas do Paraná, sendo 159 em rodovias estaduais e 84 em rodovias federais.
Pedro Valdir Carlos, de Apucarana, é caminhoneiro há 15 anos e estava ontem na manifestação de Aricanduva, na BR-369. Segundo ele, o movimento está mais forte do que nunca. “O caminhoneiro descobriu a sua verdadeira força e fez com que o Brasil se unisse em prol da redução dos impostos. Não estamos aqui só pela nossa categoria, mas por todo o país. Até a polícia e o exército concordam com a nossa causa. Isso nos dá força para continuar”, afirma.
Caminhoneiro há três anos, Israel Mazzetti, de Londrina, também estava no local. Ele afirma que a medida do Governo Federal é uma forma de tentar enfraquecer o movimento. “A população está conosco. Estamos recebendo ajuda de várias pessoas. Muitos agricultores têm trazido comida, água e nos apoiado”.
Marcelo Macedo trabalha há nove anos como caminhoneiro. Ele é de Caçador (SC) e, mesmo longe de casa, faz questão de se manter protestando. “É para o bem do país. Acho que estamos fazendo a coisa certa. Queremos o apoio de todos. Só assim para mudarmos algo no Brasil”.
Cargas especiais vão circular no Paraná
O Governo do Estado e lideranças do movimento dos caminhoneiros fecharam um acordo para possibilitar o trânsito de cargas especiais nas estradas do Paraná.
Caminhões com adesivo de identificação da Defesa Civil poderão circular pelas rodovias transportando insumos hospitalares, produtos químicos, ração animal, alimentos para hospitais e penitenciárias, combustível para os serviços de segurança e de urgência e emergência, além de cargas vivas. Os adesivos começaram a distribuir os adesivos ontem.
A governador Cida Borghetti (PP) também determinou que a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Infraestrutura do Paraná (AGEPAR) estude da viabilidade da não cobrança de pedágio do eixo suspenso dos caminhões enquanto durar a crise de desabastecimento de combustível e o impacto que a não cobrança iria produzir nas tarifas.
População reclama de abusos
e critica defesa da ditadura
Vários motoristas ligaram ontem à noite para a Tribuna para criticar a abordagem dos grevistas que protestam na BR-369 no Distrito de Aricanduva, em Arapongas. Alguns também disseram estar “horrorizados” com a defesa do regime militar feita por muitos caminhoneiros nesse piquete. Segundo eles, esse comportamento não ocorre nos demais locais de manifestação da região, onde os grevistas estão recebendo, inclusive, apoio da população.
Condutores de caminhonetes e utilitários estão sendo parados pelos grevistas e tendo seus veículos revistados no Distrito de Aricanduva. “Isso é um abuso e fere os nossos direitos constitucionais”, assinala um dos motoristas, que preferiu não se identificar. “Os caminhoneiros estão passando dos limites. O governo federal sinalizou com um acordo e cedeu, mas o movimento não quer dialogar ”, acrescentou, observando que esse tipo de conduta ocorre apenas em Aricanduva. “Passei em outros bloqueios e isso não aconteceu”, assinalou.
Outro leitor fez duras críticas às faixas e cartazes dos grevistas em defesa do regime militar também no Distrito de Aricanduva. “Essa defesa da ditadura mostra uma total ignorância. Veja bem: caso o Brasil estivesse vivendo um regime militar, essas pessoas não estariam sequer protestando. Uma greve só é possível em um regime democrático. Esses caminhoneiros não sabem o quê estão falando. Se fosse uma ditadura, esses que defendem a intervenção militar seriam presos, torturados ou até mortos”, disse outro motorista.
Manifestações de apoio na região
O comércio de Ivaiporã e Jardim Alegre fechou as portas ontem em solidariedade e apoio ao movimento dos caminhoneiros. Em Ivaiporã, a paralisação foi das 12 às 14 horas. Comerciantes se concentraram na Praça Manoel Teodoro da Rocha, onde foram coletados alimentos para os grevistas. Em Jardim Alegre, o comércio ficou com as portas cerradas das 13 horas às 15 horas. Houve carreata da Praça da Igreja Matriz até o bloqueio dos caminhoneiros, em frente ao Posto Brasília, na PR-466.
Em Ivaiporã mobilização foi realizada pela Associação Comercial Industrial de Serviços (Acisi) “O apoio é necessário diante das constantes altas dos preços do diesel e demais combustíveis. O Governo fala em inflação em 2% e aumenta 30% no combustível, obviamente que não está certo”, disse o presidente da Acisi, Mauro Merigue.
Em Apucarana e Arapongas, também foram realizadas carreatas, repetindo os atos realizados anteontem. Em Mauá da Serra também houve manifestação popular.
Cirurgias e vacinação canceladas
Em Apucarana, o Hospital da Providência anunciou que todas as cirurgias eletivas estão sendo adiadas enquanto houver protestos. A assessoria de imprensa da instituição afirmou que os procedimentos já estão sendo remarcados.
Já a Autarquia Municipal de Saúde (AMS), de Apucarana, cancelou a intensificação da vacinação contra a gripe que estava programada hoje. Com o objetivo de facilitar o acesso à imunização, 10 Unidades Básicas de Saúde UBSs ficariam abertas hoje.
Segundo a AMS, a medida se deve a uma questão de logística, uma vez que o desabastecimento provocado pela greve dos caminhoneiros restringiu o uso de veículos do serviço público.