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Flexibilização de uso de armas favoreceu desvio de pistolas

(via Agência Brasil)

| Edição de 08 de dezembro de 2025 | Atualizado em 08 de dezembro de 2025

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A flexibilização do uso de armas, anteriormente restritas às forças de segurança, como a pistola semiautomática de 9 milímetros, em 2019, durante o primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, facilitou o desvio de parte desse armamento para as mãos de criminosos.

Essa conclusão está presente no estudo Arsenal do Crime, divulgado pelo Instituto Sou da Paz, uma organização sem fins lucrativos que promove o desarmamento da sociedade.

O levantamento revela que a apreensão de pistolas 9 mm mais que dobrou entre 2018 e 2023. Em 2018, foram 2.995 apreensões, número que saltou para 6.568 em 2023, representando um aumento de 119%.

Os dados abrangem os quatro estados do Sudeste: Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

Em 2018, o calibre era o quinto mais apreendido no país. Representava 7,4% do total de armas industriais. Em 2023, já era o segundo mais comum, com 18,8% das apreensões, ficando atrás apenas do revólver de 38 milímetros. No período, foram apreendidas 255 mil armas no total.

Liberação dos CACs

O estudo do Sou da Paz associa o aumento ao decreto do governo Jair Bolsonaro, de 2019, que flexibilizou a obtenção de armas por Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs).

Entre as mudanças, as pistolas 9 mm deixaram de ser consideradas de uso exclusivo das forças de segurança. Além disso, atiradores desportivos poderiam adquirir até 30 armas. Desde a campanha eleitoral, a flexibilização no uso de armas, como um atributo à liberdade de defesa, era uma das bandeiras do então candidato Jair Bolsonaro.

Os pesquisadores do Sou da Paz avaliam que a flexibilização transformou o mercado ilegal de armas na Região Sudeste.

“A migração do revólver para a pistola representa uma elevação drástica na capacidade ofensiva da criminalidade”, constata o estudo.

O documento detalha que, enquanto o revólver é limitado a cinco ou seis tiros e exige um procedimento lento de recarga, o processo é quase instantâneo nas pistolas, que possuem carregadores com 12 ou mais munições, permitindo disparos rápidos e contínuos.

O documento ainda aponta que o calibre 9 mm expulsa o projétil com 40% a mais de energia e alcance maior.

O coordenador de projetos do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, classifica a flexibilização de 2019 como “afrouxamento”.

À Agência Brasil, ele explica que a “medida permitiu uma entrada muito grande dessa arma, que é mais potente, no mercado legal”.

“Isso resultou em um número muito alto de armas desse tipo em residências, o que possibilita o que chamamos de desvio de boa-fé, quando uma pessoa adquire a arma para praticar tiro esportivo ou para defesa pessoal, e a arma é furtada ou roubada”, completa.

Além disso, o pesquisador afirma que a mudança no regulamento foi “muito mal feita e com pouca fiscalização”.

“Abriu-se um espaço para desvio de má-fé. Uma facção recrutando alguém sem antecedentes criminais para comprar essas armas e depois desviá-las para o crime”, detalha Langeani.

Imagem ilustrativa da imagem Flexibilização de uso de armas favoreceu desvio de pistolas
Arma de fogo recolhida na Campanha do Desarmamento - Arquivo/Agência Brasil

Mais rigor

Em 2023, um mês após a mudança de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou um recadastramento de armas nas mãos da sociedade.

“É algo muito importante e precisa ter um segmento da Polícia Federal para que faça um olhar para essas compras e verifique eventualmente armas que não estão mais com os seus proprietários”, defende o coordenador do Instituto Sou da Paz.

Em julho de 2023, um decreto determinou que o uso das pistolas 9mm volta a ser exclusivo das forças de segurança.

Outra medida do governo Luiz Inácio Lula da Silva foi transferir do Exército para a Polícia Federal a responsabilidade de fiscalizar o registro das CACs. A medida foi assinada em 2023, e a migração de competência passou a valer no segundo semestre deste ano.

Especializadas

Como um dos caminhos para diminuir o número de armas nas mãos de criminosos, Bruno Langeani defende que mais estados tenham delegacias especializadas no combate ao tráfico de armas, conhecidas como Desarmes.

Segundo o Sou da Paz, apenas seis estados têm Desarmes: Ceará, Paraíba, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

O levantamento do instituto apresenta também informações sobre a apreensão de armas de maior porte. De 2018 a 2023, a recuperação de fuzis, metralhadoras e submetralhadoras cresceu 55,8% nos estados do Sudeste, passando de 1.115 para 1.738.

No caso específico de fuzis, o Rio de Janeiro registrou 3.076 apreensões, mais que o dobro dos outros três estados (1.411).

"Um padrão associado ao uso intenso desse armamento por facções criminosas envolvidas em disputas territoriais", explica o dossiê.



Com informações da Agência Brasil