Não sou um homem comum e nunca disse o contrário. Nasci de uma família rica e tive muitos privilégios que poucos poderiam ter, talvez por isso não acredite verdadeiramente na meritocracia. Meu pai viajava pelo Brasil todo e sempre me trazia presentes de suas longas viagens. Para ser sincero, não me lembro de todos os presentes, pois eram muitos, mas uma longa fila de leite condensado fracionado está entre os meus preferidos. Ele sendo caminhoneiro, mesmo semanas longe de casa, não se esquecia de trazer um docinho que fosse, pois isso dizia em letras garrafais: EU LEMBREI DE VOCÊ.
A minha casa era uma mansão, sempre foi. Nela cabia, além de meu pai e eu, minha mãe, minha vó e as quatro irmãs que eles me deram. Ser querem parecer metido demais, nos dois quartos da casa, divididos por paredes de madeira nobre que não se encontra mais por aí, dormiam todos. O meu quarto era o maior de todos, nele cabiam as seis camas, sendo uma de minha vó, cinco de minhas irmãs e a minha, que ficava bem próxima a janela, que dava direto para a lavanderia no fundo da casa.
Ainda que houvesse muitas pessoas, nunca faltou comida, pelo contrário, tudo era em abundância. Lembro com carinho das fornadas de pão que minha mãe fazia, no mínimo uns 6 há quatro ou cinco dias. Depois do pão descansar embaixo de uma coberta, que também era minha, era assado e assim que saia do forno estavam todos ali, ao redor da mesa esperando o seu pedaço. Dizem as minhas irmãs, que houve uma época que a nona ensinava a comer o pão com um fio de óleo e uma pitada de sal, coisa que aprendi já adulto se tratar de um costume italiano na ausência do azeite. Infelizmente eu já peguei a fase da margarina, que derretia no pão quentinho, mas penso que o sabor era o mesmo.
Na parte de baixo da pia, quando eu chegava da escolinha, havia um bule de café a ser requentado, coisa que eu nunca fiz, pois gostava dele assim, quase gelado e bem doce. Não sei o por quê, mas aquele café tinha o gosto da minha vó, da Escolinha do Professor Raimundo na TV de tubo com 13 botões de canais na frente e de pão, muito pão.
Todas as festas eram verdadeiras celebrações. Tive festas em todos os meus aniversários com a casa sempre cheia. Minha mãe fazia um bolo tão grande que não era possível que comer tudo de uma vez só, a ponto de todos levarem um pedaço no fim da festa. Sempre ganhei muitos presentes, todos estavam presentes. Fora de época, vez ou outra, um primo maior mandava uma caixa com roupas e sapatos novos que não lhe cabiam mais. Eu sempre tinha muitas roupas bonitas, algumas podiam, inclusive, acompanhar o meu crescimento. Penso que talvez eu fosse maior aos olhos de meus parentes, já que o sapato eram sempre dois ou três números maiores. Era assim que me viam, como alguém que era grande, poderoso e imponente.
Sei que talvez essa soberba toda que aqui apresento possa parecer um exibicionismo, mas é só porque eu tenho certeza de que sei que sempre fui rico e não escondo isso. E para ficar ainda melhor, já grande aprendi a administrar a minha riqueza, sendo que hoje talvez me considere milionário. Investi tudo aquilo que recebi em um projeto de longo prazo que me trouxe três novos negócios. Tenho gastado muito com esses novos investimentos, mas a rentabilidade é diária e sei que o futuro será ainda melhor., afinal, aprendi a investir com o meu pai que sempre foi rico e hoje não há dinheiro nenhum mundo que possa comprar o que ele conquistou. E olha só, depois disso tudo, ainda sou herdeiro.