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Quantas vezes passamos sem ver?

Da Redação

| Edição de 05 de setembro de 2024 | Atualizado em 05 de setembro de 2024

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Dia desses vi uma postagem no Instagram com a foto de um grafite de uma criança negra e um coração. A obra estava pintada na lateral de uma caixa de energia, em frente a um banco da cidade. A legenda dizia: “quantas vezes passamos sem ver?”. A autora do post, que por acaso é a primeira a ler esse texto, já que é editora deste jornal, Adriana, me fez pensar em quantas possibilidades essa pergunta traria, sobre a nossa cegueira cotidiana.

Pelo campo da arte, sendo uma professora de artes, fiquei pensando em quantas obras estão por aí espalhadas e fora dos grandes museus, o que não as tornam menos importantes, porém, invisíveis para a maioria de nós. A beleza de uma simples gravura e sua crítica social, naquele local, virada para a rua, estava invisível para a maioria de nós, já que andamos constantemente olhando para baixo, seja pelo peso das responsabilidades ou medo de tropeçar. Agora que sei que ela existe, talvez eu sinta medo de não mais vê-la quando me acostumar com sua presença.

Pelo campo social, quantas crianças (de carne e osso) não passam por nós entre as calçadas apertadas e um semáforo fechado. Elas não têm nome, não tem idade e, dizem que talvez não tenham sonhos, o que é uma grande mentira. Infelizmente, a situação em que vivem as condena ao ostracismo social sem que saiam de sua cidade. São párias, que ao falar baixinho, mal escutadas, na maioria são respondidas com “não tenho”, mesmo que não tenham pedido nada.

Sou imperfeita demais para tentar criar teorias e julgamentos sobre as pessoas que estão em situação de rua ou de passagem por aqui, o que não quer dizer fechar os olhos para os problemas ou aceitar o que é ilegal, porém, existe dentro de cada ser humano um universo infinito de medos e sonhos roubados, seja pela violência, vícios e tantos outros tormentos que afligem a humanidade. Não consigo imaginar qual cenário faria alguém preferir viver e fazer com os seus vivam em situação de rua, mas seja qual for, não pode ser desconsiderado ao falar sobre eles. Pode parecer difícil imaginar para alguns, mas eles são seres humanos assim como eu e você. Eles não são o problema social, mas foi um problema que os colocou ali, então combater a sua presença ao invés do motivo que o levou até ali, é o mesmo que acabar com uma cabeça cheia de piolhos colocando apenas um boné. Talvez você não veja, mas eles estarão ali. E coçando, muitas vezes, já que o problema não foi resolvido.

Por fim, e já que estamos no famigerado Setembro Amarelo, quantas vezes não vemos as pessoas que estão ao nosso lado, com suas dores e aflições? Quantas vezes não esperamos um momento ideal para o encontro das amigas que nunca chega, sem perceber que talvez cada convite fosse um pedido de ajuda. Aqui em casa, defendemos que o mês amarelo deveria ser o ano todo, pois as dores da alma não têm calendário tão atualizado. Caro leitor e leitora, como mentora de inteligência emocional, como professora e como mãe e esposa, posso afirmar: a depressão e tantos outros transtornos emocionais não possuem uma receita padrão e nem uma “cara” de longe reconhecível. A tristeza aparece mascarada de um desânimo, que parece uma preguiça pós-almoço de domingo, só que todos os dias o dia todo. Ou, como irritabilidade com os pequenos detalhes, uma falta de comunicação efetiva. Quando o choro aparece é porque já choveu demais naquela cabeça, mas como disse a Adriana, “quantas vezes passamos sem ver”?

Thays N. D. Bomba