Ontem, a temperatura mínima em Apucarana atingiu 16ºC. Há 47 anos, as condições eram muito diferentes. O frio do dia 18 de julho de 1975 entrou para a história após uma geada negra mudar a economia do Paraná e a paisagem do Norte do Estado, que nunca mais foi a mesma. Acabava ali o ciclo do café. A geada dizimou mais de 300 mil hectares de cafezais em um dia. A partir daí, as chamadas lavouras brancas – como soja, milho, trigo e algodão -, que já davam sinais de crescimento na época, encontraram o espaço definitivo para se estabelecer na cena paranaense.
A geada de 1975 está na lembrança dos mais velhos e entrou para a história. Toda uma geração é capaz de lembrar o que aconteceu naqueles dias, quando os pés de café queimaram até a raiz e precisaram ser eliminados. Em todas as regiões do Estado, além do café e de toda e qualquer plantação existente na época, se multiplicavam relatos de animais domésticos e silvestres que morreram congelados naquela madrugada abaixo de zero.
Atualmente, o café retrata a esperança da retomada, não dos dias de glória, mas de um novo ciclo que, se não tão expressivo quanto aquele do apogeu, seja marcado pela produtividade e qualidade.
Nas décadas de 1950 e de 1960, a cafeicultura teve sua fase de maior expansão no Estado, quando a área quintuplicou, passando de quase 300 mil hectares, em 1951, para 1,6 milhão de hectares em 1962. Hoje, o Paraná tem menos de 50 mil hectares plantados de café.
Para se ter ideia, na safra de 1961/1962, o Paraná colheu cerca de 21,3 milhões de sacas de 60 kg, o equivalente a nada menos do que 28% da safra mundial naquele ano. Por um longo período, o café foi o principal gerador de riquezas para o Estado.
O ex-prefeito de Sabáudia, Almir Batista, foi um dos que lembraram, a tragédia de 47 anos atrás. Através de suas redes sociais, publicou um post em que escreve sobre aquele dia. “Para os adultos, a triste recordação, para os jovens, a história”, disse.
Batista lembra que o Paraná “era como uma mata verde”, com os cafezais cobrindo grande parte do solo agrícola do estado. “Nos sítios, milhares de famílias e, nas fazendas, as colônias de casas, onde faziam grandes movimentos com a mão de obra dos cafezais”, recorda. “De repente, chega o frio e numa noite memorável. Na madrugada, mães socorrem seus filhos, trazendo para suas camas, pois o frio era até perigoso. E assim que amanheceu, o Paraná, de Norte a Sul, de Leste a Oeste, era como um véu de noiva, todo branco pela geada e neve. Bastou o sol chegar para que tudo mudasse de cor e ficasse preto, queimado, escuro, tudo perdido. Choro, lágrimas, prejuízos, dívidas”, lembrou.
Dirce Guizzo, natural de São Pedro do Ivaí e que hoje mora em Mandaguari, também tem lembranças tristes da data. “Eu me lembro, vários animais morreram no sítio em que morávamos”. Leonilce Navarro, de Arapongas, também compartilhou memórias: “Tristeza, nem gosto de lembrar de ver aquela terra preta”.
Área de plantio vem encolhendo há décadas
A geada de 1975 foi a mais importante para a mudança de ciclo econômico do Paraná. Mas não foi a única. Paulo Franzini, economista do Deral, em Apucarana, recorda que a cultura do café teve momentos importantes de encolhimento em 1994, em 2000 e em 2021.
Em 1990, por exemplo, o Paraná ainda ostentava 500 mil hectares plantados de café. Em 2000 a área era de apenas 170 mil hectares. Em 2010, eram 80 mil hectares de plantações, que reduziram após a geada de 2013. Em 2022, informa o técnico, um dos maiores especialistas da cultura no Estado, a área de café chega a módicos 30 mil hectares. Quase nada perto dos 1,6 milhão de hectares no apogeu da cultura no Estado, no início da década de 1960.
Franzini destaca que na base do Núcleo Regional de Apucarana, da Seab, a área de café caiu de 9.510 hectares em 2010 para apenas 2.800/ha em 2020, ficando em aproximadamente 2.500/ha nesse ano.
Sérgio Empinotti, colega de Franzini no Deral de Ivaiporã, informa que a área na base daquele núcleo Regional também registra quedas consecutivas nos últimos anos. Eram 7.530/ha em 2010, caiu a 2.940/ha em 2020 e também não passa de 2.500/ha em 2022.
Franzini relata que há atualmente boas experiências locais de incentivo ao café, em Apucarana, Jandaia do Sul, Grandes Rios, Jardim Alegre. Mas os preços dos insumos, como mudas, e a dificuldade para se conseguir mão de obra tem desestimulado o plantio e ainda ocorrem casos de erradicação de lavouras.
Atualmente, o café fica restrito à produção em pequenas áreas, geralmente em ambiente familiar. O médio produtor está saindo da produção. “As produções em áreas maiores dependem de escala e os custos acabam inviabilizando. E as pequenas áreas, atualmente, estão produtores que apostam em conseguir remuneração maior com base na qualidade do café”, diz.
Cooperativa tem apenas 18 produtores ativos
Osvaldo Bueno, produtor rural que preside a Cooperativa dos Produtores de Café do Pirapó (Coocapi), em Apucarana, também mostra o quanto a cultura de café vem encolhendo. Dos 210 cooperados da Coocapi, informa, 34 deles produziam café no início da cooperativa, fundada em 2010. “Muita gente abandonou o café e foi para a soja e milho”, resume. A cooperativa tem atualmente apenas 18 cafeicultores e a tendência, é que esse número diminua. “Só toca a lavoura de café quem tem área bem pequena e conta com mão de obra para família. Tá difícil formar café, com os insumos tão caros”, diz o produtor, que tem 4,5 mil pés de café.