O Restaurante Popular de Apucarana está completando 30 dias de funcionamento. São 200 refeições servidas diariamente, a R$ 2. E em apenas um mês de funcionamento, já entrou de vez na programação de sobrevivência diária para idosos, desempregados, população em situação de rua, trabalhadores, enfim, para as pessoas em vulnerabilidade alimentar.
Uma refeição de qualidade, com um serviço atencioso e simpático, ao preço de um cafezinho preto no boteco da esquina atrai diariamente um grande número de pessoas, de todos os cantos da cidade, que se dirigem cedo até o restaurante. Os 200 tickets começam a ser vendidos às 11 horas. Em tese, o local deveria funcionar até as 14 horas. Mas no máximo até o meio dia, todos os tickets já foram comprados por quem estava na fila, que começa a se formar por volta das 10 da manhã.
Um dos primeiros a entrar ontem, o aposentado Miltino Benedito de Souza, 66 anos, não esconde a satisfação. “A comida é boa demais. Pode colocar ai que minha nota é 10”, diz. Miltino fala do prazer de comer uma refeição completa. “É bom demais isso. Antes do restaurante eu tinha que gastar muito mais do que isso e me virar com algum sanduíche”, diz ele, que dirige um ônibus escolar para complementar a renda mínima da aposentadoria. “Eu recebo R$ 1.044 de aposentadoria”, justifica.
O casal Antônio Alves Filho, de 72 anos, e dona Antônia de Lurdes Pereira, 71, saiu do restaurante antes do meio dia, ambos muito satisfeitos. Seo Antônio comemora ter que pagar apenas R$ 4 pelas duas refeições. “Cavaco também é lenha”, diz ao dar uma gargalhada, para explicar para economizar o curto dinheiro da aposentadoria, vale tudo. Dona Antônia adorou a comida. E principalmente, ter ficado longe do fogão. “Gostei muito”, diz a idosa, moradora do Marcos Freire.
Helio Stefani, 81 anos e Adélia Stefani, 69 anos, moram no Jardim Santa Helena, zona sul. Tímidos, não escondem a dificuldade em gerir o orçamento que fica apenas na aposentadoria de Helio. A sorte, diz ela, que tem a casinha, “herança de papai”, ressalta. Sobre a renda com a aposentadoria, dona Adélia diz que não dá para comprar nada. “A gente paga luz, água, enfim, luta todo dia para viver”, diz Adélia. Com vergonha da batalha diária pela sobrevivência, pedem para não ser fotografados. Sobre a comida no restaurante, são rápidos. “É 10”, diz Hélio, apoiado por Adélia. “É tudo muito gostoso”, complementa.
Público de várias regiões da cidade frequenta o local
O aposentado Bartolomeu Queiróz, de 70 anos, e o operário Aparecido de Barros, 63 anos, o Barrinho, varredor de rua que cuida do centro da cidade, são assíduos no Restaurante Popular. Não se conhecem. Mas tem muito em comum. Estão muito gratos. Além de barata e boa, a comida servida ali adianta a vida dos dois homens, que moram sozinhos. “Antes do restaurante era ficar sem comida ou, de meio dia, ir para casa e fazer a comida, quando tinha o que cozinhar”, conta Barrinho. Ele entra as 5 da manhã no trabalho. Há nove anos na varrição de rua, o viúvo Barrinho diz que nunca foi tão bom como nos últimos 30 dias, quando pode comer bem no Restaurante Popular. “Rapaz, aqui tá tudo ótimo viu! Comida muito boa e tem até sobremesa, todos os dias”, avalia, mostrando a laranja que levava para comer mais tarde.
Bartolomeu também mora sozinho, na região do Sabiá. Ele atravessa a cidade todos os dias para comer no Popular. Ele fez questão de falar com a reportagem para contar da sua satisfação. “A comida é boa, é barata. E todo mundo aqui trata a gente com muito respeito, com muita atenção. As meninas, todas elas, são muito educadas e atenciosas com a gente. Isso não tem preço”, relata. “Essa comida barata ajuda a administrar os gastos. Agora nem preciso cozinhar. Mas o tratamento que a gente recebe também faz a diferença”, avalia
Prefeitura acompanha funcionamento em avaliação técnica
A Prefeitura de Apucarana está levantando dados para uma avaliação técnica do Restaurante Popular. A Secretaria Municipal de Assistência Social tem monitorado diariamente o funcionamento do restaurante, procurando inclusive fazer um levantamento do perfil dos usuários, como forma de compreender melhor a demanda e fazer os ajustes necessários.
Uma das possibilidades, inclusive, é acionar um aditivo ao contrato que foi licitado, que pode chegar até a 25% do valor, o que significa ampliar o serviço para 250 refeições/dia. A secretaria também está quantificando, inclusive, a demanda diária que é frustrada.
Ana Maria Schmidt, assessora da secretaria de Assistência Social, está todos os dias no local. Além das pesquisas formais para saber a opinião das pessoas sobre o projeto, faz sempre que pode sua pesquisa de satisfação, conversando com os frequentadores. “A gente precisa entender esse fluxo. “O resultado, geral, é positivo”, assegura.
Preliminarmente, diz, perto de 60% dos usuários do restaurante são homens, a maioria, idosos. Segundo Ana Maria, há uma certa quantidade de pessoas, geralmente trabalhadores, que não se enquadram, necessariamente, no público alvo do restaurante. “É preciso compreender que vulnerabilidade social é diferente de vulnerabilidade alimentar. Tem gente que precisa, mas não está numa emergência. Quem está em vulnerabilidade alimentar é sempre um caso de emergência, uma prioridade”, afirma.
Ana Maria faz questão de explicar que, em hipótese alguma, alguém é barrado no local. “Todas as pessoas, veja bem, todas as pessoas, têm o direito à alimentação. Qualquer um que chegar aqui e entrar na fila, vai ser atendido sem problema, dentro daquela quantidade diária de serviços. Comida é um direito universal. Mas alguns locais têm pessoas prioritárias”, explica, na esperança que as pessoas compreendam que o Restaurante Popular é para atender as pessoas em vulnerabilidade alimentar. Outras pessoas, que não seriam o público-alvo do projeto, segundo estima a assessora, talvez cheguem a 10% do público preferencial.
Os dados levantados no primeiro mês de funcionamento do Restaurante Popular estão em fase de tabulação para avaliação dos resultados iniciais. “Mas é um projeto que, sem dúvida, veio para ficar. A demanda diária nos mostra sua relevância social”, afirma Ana Maria Schimidt.