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Palhaças se reúnem no Rio em festival com arte e resistência

Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil (via Agência Brasil)

| Edição de 12 de dezembro de 2023 | Atualizado em 12 de dezembro de 2023
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Resistência é a palavra que define as mulheres palhaças no Brasil, disse nesta terça-feira (12) à

Agência Brasil

Karla Concá, uma das fundadoras do grupo As Marias da Graça, cujo trabalho foi iniciado em 1991. Atualmente, o grupo é formado por Karla, Vera Ribeiro, Geni Viegas, Samantha Anciães e Ana Borges.

Naquela época, as palhaças enfrentaram muitos preconceitos, contou Karla. “Mas nós fomos muito resistentes. Eu sempre brinco que a gente acabou não ouvindo as frases preconceituosas e continuamos seguindo em frente. Essa foi a nossa resistência”. A primeira frase que o grupo ouviu quando começou a aparecer foi de um palhaço homem que indagou por que elas não tiravam o nariz, já que eram tão bonitinhas. “Imagina se a gente tivesse atendido a isso. Infelizmente, muitas mulheres atenderam, mas nós não. Hoje em dia, muita coisa mudou. Há muitas palhaças no Brasil inteiro. Temos seminários, palhaças na universidade fazendo mestrado, doutorado. A gente caminhou muito mesmo”. As Marias da Graça foram referência para novos grupos de palhaças que surgiram no país.

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Até hoje, porém, as palhaças ouvem barbaridades, relatou Karla. “A diferença é que, hoje, as mulheres que ouvem isso têm outras mulheres para contestar, têm onde pesquisar. Antes, isso não existia”. Alguns homens chegam a exigir que as palhaças retirem cores mais alegres do rosto, como o azul, por exemplo, alegando que maquiagem de palhaço é preto, branco e vermelho. “Isso é algo que incomoda muito a grande maioria dos homens, em especial os palhaços mais antigos”.

Segundo Karla, professores em sala de aula alegam, inclusive, que a pele das palhaças está muito à mostra e indagam por que elas não cobrem mais o corpo, porque isso distrai a atenção. Karla argumentou que se os homens estão olhando para as saias curtas e não para as palhaças, “o problema não é nosso. É de quem está se distraindo nesse lugar”. Até hoje, elas enfrentam esse tipo de comentário. Karla admitiu, contudo, que as coisas melhoraram em termos de informação.

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Festival internacional Esse monte de mulher palhaça. Lipsync - Adrilene Muradas/Divulgação

Palhaçaria reunida

Na próxima quinta-feira (14), começa no Rio de Janeiro a nona edição do festival Esse Monte de Mulher Palhaça, criado pelo grupo As Marias da Graça em 2005 e que ocorre a cada dois anos. O evento ocupará o Sesc Tijuca, na zona norte da cidade, até o dia 17, apresentando programação variada de espetáculos de palhaçaria nacional e internacional. O principal objetivo é fomentar, dar espaço e visibilidade para a palhaçaria dedicada e feita por mulheres em toda a sua diversidade. No Brasil, já são cerca de 18 festivais de mulheres palhaças. “É o país com maior número de festivais no mundo”, comentou Karla Concá. Os espetáculos têm entrada franca e ocorrerão nos seguintes horários: dia 14 (19h); dia 15 (16h; 17h30; 19h); dia 16 (17h30; 19h); e dia 17 (11h;16h; 17h30).

Nesta edição, o festival apresenta oito espetáculos vindos de diferentes partes do país e do mundo, com foco dramatúrgico na mulher e na expressão feminina. A montagem Cabaré Divinas Tetas, de Belo Horizonte (MG), abre a programação, no dia 14. No dia seguinte, segue com o espetáculo Rodando, de Mar Del Plata (Argentina), estrelado por Espuma Bruma, professora de literatura que resolveu viajar pelo mundo com sua corda bamba. De Palmas (TO), o festival apresenta As Charlatonas, da Trupe-Açu Cia de circo de Taquaruçu, que fala sobre a importância da diversidade feminina para o desenvolvimento da humanidade. O dia fecha com Clowns en la Pista del Swing, espetáculo do Chile, composto por uma série de atos cômicos desenvolvidas em duplas e solos, com pequenas intervenções, que vão ligando cada um dos quadros.

O terceiro dia do festival abre com Umana, de Portugal, encenado por Maria Simões, que aborda o envelhecimento e a vontade da eterna juventude. Em Vírgula iLtda, Jéssica Alves dá vida a Vírgula, uma trabalhadora como todas, que vive fechada no escritório, atrás da mesa cheia de papéis, lutando para se concentrar em suas tarefas.

No domingo (17), será encenado o espetáculo Uma Saga na Quarentena, do Rio de Janeiro, a única que conta com a presença de um homem em cena. Desde a edição de 2012, foi aberto um recorte para que a família circense pudesse estar inserida no festival, no espaço denominado Circo de Família. Nesse contexto, são convidadas mulheres que atuam com seus parceiros e que tenham na proposta dramatúrgica o viés da equidade de gênero.

De Brasília, participa o espetáculo cômico musical Abre Alas Uma Valsa a Doidivanas, criado a partir das referências do circo-teatro, da musicalidade das palhaças cantoras, dos excêntricos musicais. Ele presta homenagem à compositora, pianista, maestrina brasileira Chiquinha Gonzaga, grande nome da música brasileira nos séculos 19 e 20 e sinônimo de resistência feminina. A programação encerra com um grande Cabaré, composto por nove mini espetáculos (de até 5 minutos cada).

Na praia

Todas as mulheres palhaças que participarão do festival se reunirão na Praia de Copacabana no dia 16, às 9h. “É uma diversão”, garantiu a fundadora do Marias da Graça. “Vamos fazer esse mergulho, que é divertidíssimo. As palhaças todas caem na água. É uma celebração”. Não haverá nenhum ato político porque, disse Karla, “a nossa existência já é um ato. A gente está indo para se divertir, para celebrar o riso”.

Debates

Durante o festival haverá três lançamentos de livros: Filosofias de Concessa, de Cida Mendes; Memórias de Hospital: Relatos de uma Palhaça Apaixonada, de Enne Marx e Bololôs; e Armários, Moitas e Ruínas: Apontamentos Sobre Comicidade e Dissidência, de Manu Castelo Branco.

Serão promovidas também duas mesas de debates com foco em políticas públicas para cultura e mercado de trabalho. A primeira, dia 16, vai debater sobre políticas públicas em si. A segunda, dia 17, vai discutir sobre as diferentes formas de fazer humor, passando pelo stand up até a palhaçaria. Temas como assédio, palhaçaria social, políticas públicas, trabalho serão abordados no festival, além de sobrevivência financeira. Outra ideia é mostrar como se pode ampliar o mercado de trabalho para outros possíveis financiadores, além do teatro.

Por fim, o festival vai oferecer quatro oficinas. No dia 14, as oficinas Palhaçaria de Terreiro, com Antonia Vilarinho, de Santa Catarina; e Oficina Palhaçaria Social, com Maria Simões, de Portugal. No dia 15, é a vez de Adriana Morales, Dagmar Bedê, Eli Nunes e Rafael Bacelar (Minas Gerais) ministrarem a oficina Política, Sexualidade e Identidade na Performance de Cabaré. E de 18 a 22,  será a oficina Dramaturgia na Palhaçaria, com Karla Concá e Ana Borges (RJ/MG), online. O Sesc Tijuca está situado na Rua Barão de Mesquita, 539.

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Festival internacional Esse monte de mulher palhaça. As Charlatonas - Gabriela Grammont/Divulgação

História

A primeira edição do Esse Monte de Mulher Palhaça ocorreu em 2005, com o objetivo de ajudar a transpor a ausência da palhaçaria feminina no Brasil, tornando-se local de encontro e de formação de rede para as artistas. Nas oito edições bienais, que somam 24 oficinas, 109 espetáculos, mais de 300 palhaças brasileiras e 50 palhaças internacionais foram mobilizadas, com um público estimado em 8 mil pessoas e servindo de inspiração para festivais e encontros de palhaçaria feminina pelo Brasil.