Belém despertou neste sábado (11) com a tradicional romaria do Círio Fluvial, um dos eventos que compõem as celebrações do Círio de Nazaré. Partindo às 9h do Trapiche do Distrito de Icoaraci em direção à Escadinha da Estação das Docas, a imagem Peregrina é transportada a bordo do navio Garnier Sampaio, da Marinha do Brasil, que também organiza e controla a romaria.
Estima-se que cerca de 50 mil pessoas e mais de 400 embarcações participem da romaria em homenagem a Nossa Senhora de Nazaré.
Considerada uma das mais belas procissões do Círio, a Romaria Fluvial acontece desde 1986. O percurso dura aproximadamente duas horas, cobrindo 10 milhas marítimas (cerca de 18,5 km). A chegada da Imagem Peregrina à Escadinha (Praça Pedro Teixeira) é marcada por honras de Chefe de Estado, uma vez que uma lei estadual de 1971 proclamou Nossa Senhora de Nazaré Padroeira do Pará e Rainha da Amazônia.
Na sexta-feira, a maior procissão em extensão, com a imagem peregrina de Nossa Senhora de Nazaré, percorreu 52,3 quilômetros sem incidentes até as 18h. Neste sábado, outras procissões ocorrem: a procissão rodoviária, com 24 quilômetros, antecedeu a Romaria Fluvial e, posteriormente, haverá a moto romaria.
À noite, acontece a Trasladação, que dura cerca de 5 horas e meia, antecipando o evento principal do Círio, que começa amanhã às 6h, atraindo cerca de 2 milhões de pessoas.
Procissão
Este ano, a maior procissão católica do mundo celebra sua 233ª edição às vésperas da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30), sendo considerada a COP da floresta.
Reconhecido como patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, o Círio de Nazaré é uma festa que demonstra a devoção do povo paraense, com previsão de mais de 2 milhões de pessoas na procissão deste domingo (12).
Casa de Plácido
Um local de abrigo, solidariedade, acolhimento e amor, a Casa de Plácido homenageia o agricultor e caçador paraense Plácido José de Souza, que em 1700 encontrou a pequena imagem de Nossa Senhora de Nazaré entre pedras lodosas às margens do Igarapé Murutucu, onde hoje se ergue a Basílica.
Após o achado, Plácido levou a imagem para sua choupana, mas no dia seguinte, ela havia desaparecido. Ao retornar ao local do encontro, lá estava a imagem novamente. Este fenômeno se repetiu várias vezes, levando Plácido a construir uma ermida no local. Muito além da história, é na “Casa de Plácido” que o milagre da fé se manifesta no ritual do lava-pés, uma demonstração de humanidade e doação.
Por ali passam as caravanas dos romeiros. Segundo a coordenadora da Acolhida da Casa de Plácido, Maria da Conceição Rodrigues, este ano são esperadas 18 mil pessoas, atendidas por equipes de voluntários que trabalham em revezamento.
“Estamos neste Círio com 530 voluntários de diversas profissões, incluindo médicos, advogados, contadores, pedreiros e desempregados. Temos também estudantes de medicina e fisioterapia atuando como massagistas. Somos 14 equipes de trabalho, incluindo atendimento, recepção, alimentação e cozinha”, explicou Maria da Conceição.
A Casa de Plácido presta atendimento aos romeiros do Círio. O local foi aberto oficialmente na quarta-feira (8) e permanece aberto até amanhã (12), às 13h, reabrindo na terça-feira (14) para o restante da quinzena do Círio. O fechamento ocorre para que os voluntários também possam acompanhar a procissão de domingo.
“Ano passado, recebemos 238 caravanas e 20.500 pessoas apenas de caravanas, além de 11 mil romeiros visitantes. Acreditamos que essa expectativa aumentará, já que até quarta-feira, antes da abertura oficial, já tínhamos 212 caravanas inscritas e uma média de 18 mil pessoas”, disse.
“Por exemplo, se alguém chega passando mal, vai direto para o serviço médico, onde pode receber soro ou insulina, se necessário. Caso o médico avalie que o caso é mais grave, temos uma ambulância para encaminhamento ao hospital”, descreveu.
Arte e devoção
O Círio de Nazaré é um evento de múltiplas dimensões, que além de congregar fé, devoção e renovação da esperança, está presente em cada canto de Belém e no trabalho de artistas e artesãos que buscam traduzir essa experiência. Uma dessas pessoas é a artista paraense Aline Folha, que cria peças como camisas e louças com o tema do Círio.
“Desde o começo do mês, eu já vivo o Círio. Eu vivo em estado de outubro, como o paraense gosta de falar. A gente tem essa coisa de esperar pelo cheiro da cidade que fica diferente, a energia das ruas, que fica diferente”, relata.
Este ano, Aline foi convidada a criar a ilustração das peças de comunicação e ativações do Círio para uma empresa de mineração. Sua obra explora estados emocionais do cotidiano feminino, especialmente a vivência do maternar, em busca de liberdade, acolhimento e possibilidade. A artista imprime em suas criações os rastros do processo artístico, evidenciando a presença da água e do grafite na relação entre desenho e aquarela.
“O Círio para mim é uma experiência bastante pessoal. Tem algo de subjetivo e algo que vivemos em conjunto, em comunidade, uma memória coletiva que nos inspira a criar, nós artistas”, explica. “O que me emociona é o ritual que cada pessoa vive, o ritual de família de sair para ver a santa passar no mesmo cantinho todos os anos”, aponta.
Reconhecida por sua sensibilidade e autenticidade, Aline já foi convidada três vezes (em 2016, 2017 e 2022) para criar os mantos oficiais do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, a maior manifestação cultural-religiosa do Pará. Em 2023 e 2024, foi escolhida por uma empresa para desenvolver as primeiras coleções de louças temáticas da festividade, intituladas Caminhos do Círio e Raízes de Fé, projetos que celebram a fé e a identidade paraense com traços delicados e simbólicos.
“Minhas principais inspirações vieram das sensações que o Círio provoca em quem o vivencia. Busquei representar esses sentidos aflorados e como eles podem despertar memórias afetivas e coletivas nessa grande festa paraense”, conta Aline. A arte criada este ano incorpora diversos elementos culturais como o tacacá, os brinquedos de miriti, os gritos de “viva, viva, viva”, os fogos de artifício e a figura feminina que acolhe uma criança. “O principal desafio foi manter o aspecto aquarelado em uma arte que pudesse ser aplicada de formas e tamanhos diversos nas peças da campanha”, acrescenta.
Aline realizou as seguintes exposições individuais: “Elas”, no Espaço Cultural do TRT-8; “Elas Estampadas”, na Casa Oiam; “Florescer Mãe”, no Shopping Bosque Grão Pará; e “O Peso das Coisas Leves”, novamente no Espaço Cultural do TRT-8.
Atualmente, faz do seu atelier na capital paraense um espaço múltiplo, onde além de produzir, também realiza cursos livres ou corporativos, e recebe o público, clientes e alunos.
*A repórter viajou a Belém a convite da Vale
Com informações da Agência Brasil