Encerramos 2025 e abrimos 2026 sob um sentimento ambíguo. De um lado, os números oficiais insistem em mostrar virtuosismo econômico. De outro, a qualidade desse crescimento e os seus desdobramentos para a inflação, para as contas públicas e para o cotidiano das pessoas exigem uma análise menos complacente e mais honesta. O conforto das manchetes otimistas não pode substituir o incômodo das perguntas certas. Revisito minha análise anterior com um tom mais analítico.
O ano de 2025 marca uma inflexão relevante na trajetória da conjuntura. Depois de quatro anos de surpresas positivas no crescimento do PIB, o país volta a um padrão mais previsível e menos virtuoso. O crescimento projetado, ao redor de 2,3%, não é desprezível, mas está longe de ser transformador. Está muito aquém do necessário para compensar a fome voraz de gastos do governo federal. Mais grave do que isso é a sua composição.
A expansão tem sido puxada, sobretudo, por setores menos cíclicos, como a agropecuária e a indústria extrativa, enquanto os segmentos mais sensíveis ao ciclo econômico desaceleram de forma clara.
Crescimento baseado em choques favoráveis de oferta, como boas safras e condições climáticas benignas, ajuda a conter preços no curto prazo. Mas esse tipo de crescimento não cria, por si só, um ciclo robusto e sustentável de investimento, inovação e aumento de produtividade. Ele alivia a inflação hoje, mas não garante estabilidade amanhã. É um crescimento que resolve o presente e adia o futuro.
A inflação, aliás, continua sendo o grande teste de maturidade econômica do país. Houve, sim, uma desaceleração em 2025, concentrada em bens industriais e alimentos, favorecida pela apreciação cambial e pela expansão da produção agrícola. No entanto, a inflação de serviços, que é mais inercial, mais resistente e diretamente ligada à dinâmica fiscal e ao mercado de trabalho, cedeu pouco. Isso sinaliza que o problema não está apenas nos choques externos ou climáticos, mas na forma como o Estado brasileiro opera.
E é aqui que o debate se torna indigesto para muitos. Controlar a inflação não é apenas uma tarefa do Banco Central, por mais que seja confortável transferir toda a responsabilidade para a política monetária. O descontrole, ou a má qualidade do gasto público, é um combustível silencioso da inflação. Gastar mal, gastar sem foco, gastar sem avaliar resultados produz pressão permanente sobre preços, juros e expectativas. Não há retórica social que consiga esconder essa conta.
O Relatório de Política Monetária do Banco Central mostra que a inflação cedeu, em parte, porque a economia perdeu fôlego onde mais gera renda, emprego e arrecadação. Isso não é uma vitória. É um alerta. Combater a inflação às custas da perda de dinamismo econômico não é estratégia, é resignação.
Por isso, 2026 se impõe como um ano decisivo. Se o país insistir em discutir apenas “quanto” gastar, sem enfrentar seriamente “como” gastar, estaremos condenados a repetir o velho ciclo de crescimento medíocre, inflação teimosa e frustração social. Melhorar a qualidade do gasto público é uma exigência ética e econômica. Significa avaliar políticas, eliminar desperdícios, priorizar investimentos com retorno social mensurável e abandonar a ilusão de que toda despesa é virtuosa só porque carrega um rótulo nobre.
No fim das contas, a conjuntura deixa uma mensagem incômoda, porém necessária: inflação controlada e crescimento sustentável não convivem com improviso fiscal. Ou o país amadurece institucionalmente, ou continuará celebrando alívios temporários enquanto empurra crises estruturais para frente.