Dois estudos divulgados recentemente apontam que a Petrobras tem potencial para redefinir sua trajetória, atualmente centrada em combustíveis fósseis, e assumir a liderança na transição energética no Brasil.
Elaborados por especialistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Observatório do Clima, os documentos traçam um plano para que a maior empresa do país reduza sua dependência do petróleo e se estabeleça como um ícone em energia limpa.
Os pesquisadores destacam que essa análise surge em um contexto em que o Brasil está ampliando sua produção de óleo e gás, com o petróleo superando a soja como principal produto de exportação, representando 13% das vendas externas.
Esse cenário eleva o risco de o país ser impactado pela chamada “bolha de carbono”, com ativos se tornando obsoletos caso a demanda global por combustíveis fósseis diminua drasticamente na próxima década.
O estudo Questões-Chave e Alternativas para a Descarbonização do Portfólio de Investimentos da Petrobras, assinado pelos economistas Carlos Eduardo Young e Helder Queiroz, da UFRJ, serve de base para o segundo estudo, A Petrobras de que Precisamos, desenvolvido por 30 organizações do Grupo de Trabalho em Energia do Observatório do Clima.
Propostas para a Transição Energética
Ambos os estudos defendem que a Petrobras diversifique seu portfólio e alinhe seus investimentos às metas do Acordo de Paris e do Plano Clima, que visam a neutralidade de emissões de gases do efeito estufa até 2050. De acordo com os dados apresentados, dos US$ 111 bilhões previstos no plano de negócios 2025-2029 da estatal, apenas US$ 9,1 bilhões estão destinados a energias de baixo carbono. A Petrobras, no entanto, afirma que o investimento em energia de baixo carbono é maior, totalizando US$ 16,3 bilhões.
Os economistas da UFRJ alertam que a dependência da receita do petróleo expõe o Brasil a choques econômicos devido à volatilidade e ao caráter finito desse recurso.
“Apesar dos recursos financeiros arrecadados com royalties, impostos e demais participações governamentais, é importante recordar o risco associado à dependência das administrações públicas (federal, estaduais e municipais), já que a atividade petrolífera é caracterizada pela extração de recursos esgotáveis e cujos preços são extremamente voláteis”, complementa Queiroz.
Medidas Sugeridas
O estudo do Observatório do Clima sugere um conjunto de ações para que a Petrobras passe por essa transformação:
- Ampliar investimentos em pesquisa de biocombustíveis e hidrogênio de baixo carbono;
- Retomar a atuação em distribuição e em terminais de recarga para o consumidor final;
- Priorizar energias de baixo carbono, como hidrogênio verde, biocombustíveis de segunda e terceira geração, e combustível sustentável de aviação (SAF);
- Alinhar o plano de negócios aos objetivos mais ambiciosos do Acordo de Paris, da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil e da Estratégia Nacional de Mitigação (Plano Clima);
- Realocar recursos de refinarias para a ampliação de novos combustíveis.
Os pesquisadores também sugerem congelar a expansão da extração de combustíveis fósseis em novas fronteiras, como a Foz do Amazonas, concentrando a produção em áreas já em operação, como o pré-sal.
“A Petrobras é uma empresa crucial para o país, mas precisa internalizar a crise climática com muito mais vigor do que fez até agora”, afirma Suely Araújo, coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima.
“Seu plano de negócios pode e deve ser ousado na perspectiva da diversificação de atividades, com destaque para investimentos em energias de baixo carbono e na transição energética”.
Visão para o Futuro
Para o economista Young, o Brasil ainda dependerá do petróleo por algum tempo, mas o foco não deve ser a expansão da commodity como líder das exportações.
“A Petrobras que eu quero é uma Petrobras pública, que atinja os objetivos do desenvolvimento nacional, que mantenha, sim, uma atividade importante, mas sem uma expansão que tenha o objetivo de exportar e gerar caixa”, defende o economista.
“É preciso aumentar o investimento em transição energética e também em mitigação. Uma Petrobras mais ativa no combate ao desmatamento e também na adaptação climática”, complementa.
Resposta da Petrobras
A Petrobras, em nota, informou que aumentou seus investimentos em transição energética, destinando US$ 16,3 bilhões para projetos de baixo carbono no plano 2025 a 2029, representando um crescimento de 42% em relação ao plano anterior.
"A companhia investe fortemente em tecnologias inovadoras, com potencial de impacto no curto, médio e longo prazo. Estão previstos investimentos totais de US$ 1,0 bilhão em P&DI (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação) em baixo carbono no quinquênio, partindo de 15% do total de P&DI em 2025 e chegando a 30% do total em 2029", diz a nota.
A Petrobras também menciona recursos estimados em US$ 5,7 bilhões para energias de baixo carbono (eólica e solar fotovoltaica, hidrogênio e captura, utilização e armazenamento de Carbono), além de investimentos em bioprodutos (US$ 4,3 bilhões), etanol (US$ 2,2 bilhões), biorrefino (US$1,5 bilhão), biodiesel e biometano (US$0,6 bilhão).
"Para enfrentar os compromissos e desafios, a Petrobras tem CAPEX de US$ 5,3 bilhões no horizonte do PN 2025-2029 para descarbonização das suas operações, tendo como parte desse orçamento um valor de US$1,3 bilhão nos próximos 5 anos para um Fundo de Descarbonização dedicado a alavancar a implementação de oportunidades de descarbonização nos negócios. O fundo compõe a estratégia do programa carbono neutro, que é uma iniciativa transversal envolvendo todas as áreas de negócio da companhia. O objetivo é identificar oportunidades de mitigação de GEE [Gases do Efeito Estufa], em suas diferentes frentes de atuação, utilizando a metodologia da Curva de Custo Marginal de Abatimento (MACC) para mapear as oportunidades de maior custo-efetividade", afirma.
Com informações da Agência Brasil