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Sequelas permanentes afetam 1/3 dos motociclistas vítimas do trânsito

(via Agência Brasil)

| Edição de 21 de setembro de 2025 | Atualizado em 21 de setembro de 2025

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Um terço das vítimas de acidentes de trânsito envolvendo motocicletas atendidas nos principais serviços de ortopedia e traumatologia do país acabam sofrendo com sequelas permanentes. Essa é a conclusão de uma pesquisa divulgada recentemente pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT), que entrevistou 95 chefes e preceptores de serviços de residência em ortopedia credenciados pela entidade.

De acordo com os dados coletados, os serviços de saúde receberam, em média, 360 vítimas de trânsito por mês nos últimos seis meses, o que significa que mais de dez pacientes feridos nesses incidentes foram hospitalizados diariamente.

Dois terços dos pacientes atendidos eram motociclistas. Após a alta hospitalar, 56,7% deles passaram a conviver com poucas sequelas, enquanto 33,9% sofreram sequelas permanentes.

Em 82% dos casos, as vítimas relataram dor crônica. Sequelas mais graves também são frequentes:

  • 69,5% ficam com deformidades;
  • 67,4% permanecem com déficit motor;
  • 35,8% passam por amputações.

O estudo foi apresentado em um fórum promovido pela SBOT na Câmara dos Deputados, como parte da campanha Na moto, na moral, que visa reduzir a mortalidade de motociclistas no trânsito.

O presidente da SBOT, Paulo Lobo, reconhece que a motocicleta é um meio de transporte e de renda para muitos brasileiros, mas destaca que o objetivo da campanha e da pesquisa é contribuir para um cenário de maior segurança viária.

“Estamos vivendo uma epidemia de sinistros com motos”, alertou.

Em novembro do ano passado, Jéssica Santos, de 29 anos, voltava para casa na garupa da moto de um amigo quando colidiram de frente com outra moto. Jéssica foi lançada no asfalto, sofreu ferimentos graves na pelve, fraturou a bacia e quebrou a mão esquerda.

Após ser socorrida, passou por uma cirurgia de urgência no Hospital Municipal Salgado Filho, no Rio de Janeiro, e foi transferida para o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into). Quase um ano depois, Jéssica ainda não recuperou a mobilidade da mão fraturada e enfrenta sequelas na região da bacia.

“Hoje, faço fisioterapia para recuperar os movimentos. Recuperei cerca de 70%, mas ainda não tenho força na mão. Sinto dores na bacia, na pelve, na virilha e no cóccix, onde tenho um parafuso de titânio. E tenho uma colostomia que ainda não posso reverter”, relatou.

Perfil das vítimas

O estudo traça um perfil das vítimas de sinistros com motocicletas atendidas nos serviços de ortopedia:

  • 72,8% eram homens;
  • 40,7% tinham entre 20 e 29 anos;
  • 64% eram motociclistas;
  • 23,2% estavam na garupa;
  • 10,9% eram pedestres;
  • 29,2% tinham ingerido álcool;
  • 16% usaram outras drogas;
  • 47,1% dos sinistros foram colisões com automóveis;
  • 44,5% foram quedas.

Cirurgias

Assim como Jéssica, muitas vítimas necessitam de cirurgias para tratar os ferimentos. Os profissionais entrevistados informaram que os serviços de ortopedia realizam, em média, 45 cirurgias de baixa complexidade, 58 de média complexidade e 43 de alta complexidade por mês em vítimas de sinistros com motocicletas.

Essa demanda impactou significativamente a programação desses serviços de saúde nos últimos seis meses. Os sinistros de trânsito foram a principal causa do adiamento de uma média de 18 cirurgias eletivas por mês para atender a casos inesperados. Até mesmo cirurgias de emergência precisaram ser canceladas, com uma média de oito cancelamentos mensais.

A maior parte dessas vítimas é operada em menos de uma semana (60%) e passa menos de uma semana internada após a cirurgia (71,6%).

Apesar disso, 31% aguardam entre 7 e 15 dias pela cirurgia, e 8% esperam mais de 15 dias. No pós-operatório, 16,8% ficam até 15 dias internadas e 11,6% permanecem entre 15 e 30 dias no hospital.

Perfil das lesões

A maioria dos pacientes requer cuidados de média (43,2%) ou alta complexidade (32,6%). "As lesões traumáticas estão mais complexas. Não são mais simples fraturas, são explosões de articulações e poli fraturados", explica o ortopedista Marcos Musafir.

Mais da metade das lesões (51,4%) afeta os membros inferiores, mas um em cada cinco também tem lesões nos membros superiores (22,8%) e na coluna vertebral (22,8%).

Com ferimentos abertos e expostos, 6,5% dos pacientes apresentam infecções pós-operatórias e 12,9% precisam ser reinternados.

Propostas

Marco Antônio Motta, coordenador de Engenharia da Senatran, informou que está em desenvolvimento um programa nacional de segurança para motociclistas, com sugestões abertas até 29 de setembro pela Plataforma Brasil.

Motta revelou que está em fase experimental o projeto de faixas azuis exclusivas para motociclistas em 50 trechos de cinco cidades brasileiras. Essa etapa deve se estender até 31 de março do próximo ano.

“A partir desse momento, vamos avaliar o projeto. Se viável, a Senatran proporá uma resolução ao Contran, e os municípios interessados poderão implantá-lo dentro dos parâmetros técnicos”, explicou.

Leonardo Vilela, do Conass, destacou a urgência de reduzir o impacto dos sinistros de trânsito com motocicletas e defendeu a redução dos incentivos fiscais à produção desses veículos e a facilitação do processo de habilitação de condutores.

“Além do prejuízo humano, das mortes, ferimentos e sequelas, o prejuízo econômico é grande, com danos materiais, pessoas sem produzir e custos para o sistema de saúde e previdência social”, descreveu.

“Causa espanto que a motocicleta, grande responsável por esses sinistros, seja subsidiada”, disse.

Marcelo Matos, do Sindmoto-RJ, defende a ampliação das campanhas de conscientização sobre segurança viária e mais garantias aos motociclistas de aplicativos, que trabalham sem vínculos empregatícios.

“É preciso uma campanha massiva para mostrar os riscos das motocicletas. Hoje, vê-se jovens de chinelo, sem habilitação, trabalhando com contas falsas. E o resultado são hospitais ortopédicos lotados. As empresas não se preocupam com isso. Se um se acidentar, há mil para substituí-lo”, defendeu.

Matos aponta que, desde a chegada dos aplicativos de entrega e mototáxi, houve uma explosão da frota de motocicletas e do número de trabalhadores em plataformas.

Motociclista há 34 anos, ele conta que, aos 55 anos, sofre com dores na lombar e cervical, e se preocupa que a geração que trabalha mais horas sem direitos terá ainda mais lesões causadas pelo trabalho e acidentes.

“Muitos migraram para nossa atividade sem qualificação ou habilitação. Não têm seguridade e muitos não pagam nem o MEI”, alerta.

“Os jovens estão ficando sequelados e sem direitos. E quem segura? A família, o amigo mais próximo. O cenário é triste e o problema crescente. O poder público precisa tomar uma posição enérgica quanto a isso”, reivindica.



Com informações da Agência Brasil