O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública de Minas Gerais firmaram um acordo com a mineradora Vale definindo medidas para reparação dos danos causados em Barão de Cocais (MG). No município, mais de 400 moradores precisaram deixar suas casas devido aos riscos de rompimento da barragem Sul Superior, localizada na Mina de Gongo Soco.
A prefeitura também assinou o acordo. Conforme pactuado entre as partes, a Vale desembolsará ao todo R$ 527,5 milhões. Este valor já inclui cerca de R$ 44,5 milhões indicados pela mineradora como despesas já realizadas em ações reparatórias, em antecipações das indenizações e em auxílios emergenciais.
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Os riscos na Mina de Gongo Soco foram identificados no pente-fino realizado após a tragédia ocorrida em Brumadinho (MG) no início de 2019, quando
270 pessoas perderam suas vidas
na avalanche de rejeitos liberada no colapso de outra barragem da Vale. Diante do episódio, a Agência Nacional de Mineração (ANM) e o MPMG adotaram medidas para cobrar reavaliações das condições de segurança de diversas estruturas.
Nos casos considerados mais críticos, foi determinada a evacuação de áreas que seriam atingidas em uma eventual tragédia. Ao todo, quase mil pessoas precisaram deixar suas casas em todo o estado de Minas Gerais. Em Barão de Cocais, as evacuações tiveram início em fevereiro de 2019 e envolveram as comunidades de Socorro, Vila do Gongo, Tabuleiro e Piteiras.
A barragem Sul Superior é uma das três que se encontram no nível 3, o último na escala de classificação da ANM, reservado para estruturas que registram risco iminente de ruptura. A barragem foi construída pelo método de alteamento a montante, o mesmo associado à tragédia em Brumadinho. Anos antes, em 2015, outra estrutura similar se rompeu em Mariana (MG), causando 19 mortes e impactando dezenas de municípios na Bacia do Rio Doce. De acordo com a Vale, a barragem Sul Superior foi construída em 1982 e foi desativada em 2008. A mineradora afirma que ela vem sendo monitorada permanentemente e está em processo de descaraterização.
Programas
O acordo para reparação dos danos em Barão de Cocais foi assinado na última sexta-feira (18), em audiência conduzida pela desembargadora Ana Paula Nannetti Caixeta, coordenadora do Centro Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de 2º Grau do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Ele encerra uma ação civil pública onde o MPMG cobrava diversas medidas em benefício das comunidades. Os atingidos, no entanto, não participaram das reuniões de negociação.
Em nota, o MPMG sustenta que o acordo foi elaborado em interlocução com as famílias. Também aponta que um dos destaques é a destinação de recursos para ações de estruturação das políticas públicas de saúde no município. Foram previstos seis programas em torno dos seguintes assuntos: compensação e desenvolvimento de Barão de Cocais; transferência de renda; requalificação do turismo e cultura; segurança; fortalecimento do serviço público municipal; e demandas das comunidades atingidas.
A celebração do acordo contou ainda com a interveniência da Arquidiocese de Mariana, que é responsável pela Igreja Mãe Augusta do Socorro, a mais antiga de Barão de Cocais. Construída em 1737, ela deverá ser restaurada pela Vale.
A mineradora divulgou nota afirmando que o acordo reforça seu compromisso com a reparação das comunidades impactadas. "Uma auditoria técnica independente será contratada para acompanhamento dos resultados do acordo, assim como assessoria técnica independente para auxiliar as comunidades atingidas a selecionar, formatar e apresentar projetos", acrescenta o texto.
Boa parte das famílias que deixaram suas casas em 2019 ainda vive em imóveis alugados pela mineradora Vale, sem previsão para retorno, o que depende da conclusão do processe de descaracterização da barragem. Em algumas localidades, os moradores puderam retornar. A situação, no entanto, não é confortável, segundo depoimento da moradora Cleonice Martins Gomes em audiência pública sobre o tema realizada há três meses pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
"Vivemos com medo. Quando passa uma ambulância, já pensamos que é a sirene da barragem. Tomamos remédios controlados que não usávamos antes, remédios de pressão. Estamos pagando com dinheiro dos nossos próprios bolsos", contou. Na ocasião, Cleonice lamentou a falta de suporte aos atingidos e cobrou da Vale indenização pela desvalorização dos imóveis. Ela avaliou que as famílias não eram ouvidas pela mineradora e que direitos previstos em lei foram descumpridos.
Jucidialmente, os atingidos conquistaram em junho de 2019, o direito a um auxílio emergencial mensal a ser pago pela Vale. A mineradora chegou a pedir à Justiça a descontinuidade do benefício em 2020, alegando que mantê-lo seria assistencialismo, o que seria atribuição do poder público. O argumento, no entanto, foi rejeitado e os repasses foram prorrogados.
Descaracterização
Após a tragédia de Brumadinho, a ANM editou resolução estabelecendo datas para a eliminação de todas as barragens erguidas pelo método de alteamento a montante. Em Minas Gerais, o assunto ganhou tratamento específico pela Lei Mar de Lama Nunca Mais. Ela estabeleceu a obrigatoriedade de concluir todo o processo em três anos.
O prazo se encerrou em fevereiro do ano passado, quando apenas sete das 54 barragens desse tipo existentes no estado estavam completamente descaracterizadas. Diante do cenário, o MPMG procurou diversas mineradoras para estabelecer novos compromissos, entre eles, o pagamento de indenizações. A Vale concordou em pagar uma quantia de R$ 236 milhões.
Em agosto do ano passado, a mineradora apresentou novo cronograma indicando que a eliminação de todas as suas estruturas construídas pelo método de alteamento a montante será concluída até 2035. De acordo com a Vale, a conclusão da descaracterização da barragem Sul Superior, em Barão de Cocais, está prevista para 2029.