OPINIÃO

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As linhas de uma greve obrigatória

Por David D. Klebis, escritor e acadêmico em Apucarana

| Edição de 10 de novembro de 2015 | Atualizado em 25 de janeiro de 2022

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Gostaria de iniciar este artigo citando o parágrafo IV do Artigo 5º da Constituição Federal: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Desta forma, a greve dos caminhoneiros autônomos iniciada no início desta semana é lícita, permitida e reconhecida legalmente. Vivemos hoje em uma democracia é cada um é livre para manifestar seu descontentamento com o governo vigente.

Contudo, as atitudes da greve são repletas de contradições tão fortes que chegam a deslegitimar esta greve. Os manifestantes, por exemplo, bloqueiam as rodovias, impedindo a passagem de qualquer outro caminhoneiro não-manifestante. Ora, esta ação fere, no mínimo, três questões legais: o parágrafo XV do artigo 5º da Constituição (é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens); o parágrafo II do artigo 21 da Declaração dos Direitos Humanos (A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto); e o parágrafo II do artigo 5º da Constituição Federal (ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei).

Desta forma, percebemos que, embora seja assegurada legalmente, esta greve não respeita a individualidade de cada sujeito como cidadão. Como tal, dever-se-ia respeitar as opiniões de cada caminhoneiro, inclusive daqueles que se acham favoráveis ao governo e desejam estar trabalhando.

Há, também, o impacto socioeconômico. A paralisação obrigatória afeta, não somente a distribuição dos produtos que chegam às casas brasileiras, mas também a credibilidade do serviço daqueles que foram compelidos a permanecer nela.

Os próprios grevistas afirmaram que o objetivo principal é forçar a saída da presidenta. Estes manifestantes atribuem a responsabilidade da crise a uma só pessoa: Dilma. Os articuladores de movimentos sociais que apoiam a greve devem se lembrar de que a República é constituída por três poderes que interagem entre si: o Judiciário, o Legislativo e o Executivo. Ora, a presidenta é a autoridade máxima apenas do poder Executivo. Atribuir a culpa apenas a um dos poderes demonstra um alto grau de inocência por parte destes articuladores preocupados com a democracia e interesses do povo.

A greve forçada pode se tornar um tiro pela culatra. Os caminhoneiros forçados a não trabalhar e a população sem abastecimento de bens de consumo – consequência direta da greve obrigatória – podem se voltar contra os grevistas e o feitiço acabar virando contra o feiticeiro.