Era noite do dia 19 de julho de 2012, quando o eletricista Messias Aparecido Monteiro, conhecido como Cido, de 41 anos, conduzia sua caminhonete D-20, seguindo de Apucarana para sua propriedade rural, quando o veículo ficou desgovernado ao ter dois pneus estourados e capotou no quilômetro dois da PR-170 (Rodovia do Milho). Cido ficou preso entre as ferragens e foi levado para o Hospital da Providência. Ele faleceu no hospital, mas é o local onde ocorreu o acidente que sua família escolheu para homenageá-lo, com uma capela na beira da estrada.
“O Cido era muito querido, um homem alegre e que tinha muitos amigos. Aquela estrada era o seu caminho da roça, pois a chácara dele ficava ali perto”, conta o irmão, Regino Monteiro.
Ele conta que um tempo depois do morte do irmão, durante o processo de luto, a família decidiu fazer um memorial no local onde ele se acidentou, como forma de não apenas de honrar sua memória, mas também alertar aos motoristas para que tenham prudência na estrada, conforme explica Regino.
“Decidimos fixar uma cruz e também colocamos uma capelinha com uma santa para que pudéssemos lembrar do meu irmão”, conta.
A cruz continua no mesmo ponto até hoje e a família costuma ir ao local para rezar e fazer a manutenção do pequeno memorial.
A cruz pela memória de Cido não está sozinha. Todos os acessos rodoviários de Apucarana possuem trechos onde há cruzes fixadas.
Às margens da Avenida Brasil, no canteiro entre a pista e a linha férrea, chama atenção uma capela em homenagem a um rapaz que morreu no local em 1997. Já no Contorno Norte, ao menos três pontos contam com cruzes ou capelinhas em homenagem a vítimas de fatalidades.
Ao longo das estradas do Brasil, é comum deparar-se com cruzes fincadas à beira das rodovias. Esse costume, mescla fé, memória e tradição.
Mas não é todo mundo que se sente familiarizado com o tema. O construtor Patrick Machado da Silva, de Apucarana, admite que se sentiu intimidado quando assumiu esse tipo de serviço pela primeira vez. Na época, ele foi contratado para construir uma capelinha em homenagem a um jovem que capotou e perdeu a vida na BR-369, próximo a Jandaia do Sul.
“Eu fiquei com um pouco de receio de fazer o serviço, porque a gente acredita nessas coisas, né? Mas como precisamos trabalhar, fui lá e dei conta de fazer tudo em um só dia. Pensa em uma obra que não foi enrolada”, brinca o construtor.
No entanto, após isso, ele percebeu um nicho que o ajudou conseguir muitos outros serviços. “Passei a trabalhar com túmulos e jazigos, pois era um serviço que pouca gente fazia na época. Hoje eu vejo bem diferente, entendo que as pessoas fazem essas homenagens com carinho, por respeito a quem se foi”, salienta. (LOUAN BRASILEIRO)
Origem do costume
As cruzes à beira das estradas são mais prevalentes em regiões rurais e interioranas, onde a conexão com tradições religiosas muitas vezes permanece mais forte. Além disso, é comum encontrá-las em curvas perigosas, declives acentuados ou áreas com histórico de acidentes.
De acordo com um artigo publicado pela revista científica Ateliê Geográfico, da Universidade Federal de Goiás (UFG), a tradição de colocar cruzes à beira das estradas é uma prática antiga que remete ao Império Romano, que tinha por costume castigar seus inimigos com a morte na cruz. Após a ascensão do cristianismo, o costume passou a ter outros significados.
No Brasil, essa tradição surgiu durante o período colonial, sendo trazida para o país pelos padres jesuítas. Inicialmente, essas cruzes podiam representar marcos em áreas desabitadas, indicando direções ou alertando sobre perigos. Com o tempo, o significado evoluiu para incorporar elementos religiosos, marcando locais onde tragédias, especialmente acidentes fatais, ocorreram.